Friday, June 02, 2006

Paulicéia Desvairada

Quando sinto a impulsão lírica, escrevo, sem pensar, tudo o que o meu inconsciente grita. Penso depois: não só para corrigir, como para justificar o que escrevi. Acredito que o lirismo, nascido no subconsciente, acrisolado num pensamento claro ou confuso, cria frases que são versos inteiros, sem prejuízo de medir tantas sílabas, com acentuação determinada. Arte que, somada a Lirismo, dá Poesia, não consiste em prejudicar a doida carreira do estado lírico para avisá-lo das pedras e cercas de arame no caminho: deixe que tropece, caia e se fira. Arte é mondar mais tarde o poema de repetições fastientas, de sentimentalidades românticas, de pormenores inúteis ou inexpressivos. Que Arte porém não seja limpar versos de exageros coloridos.

(Prefácil de Paulicéia Desvairada, Mário de Andrade)

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